Ora, certo dia vinha eu da escola e não me lembro por que razão, não tinha bilhete ou dinheiro para o autocarro. E que dia tinha sido aquele! Passei mais de duas horas a jogar à bola em furos das aulas e tinha acabado de sair do treino de natação onde já tinha tido uma mão cheia de cãibras. Fui forçado a fazer a prova de montanha de primeira categoria até minha casa.
Das mais de mil vezes que fiz aquele caminho, aquele foi sem duvida o mais tortuoso que fiz. Subir a mini-montanha com a mochila da escola às costas mais o saco da natação, foi a pior coisa que me podia ter acontecido naquela altura. Arrastei os pés, marreco do cansaço e do peso das mochilas. E lá subi. A dada altura, quando faltava cerca de um terço da subida e já se começava a avistar o topo… Parei. E olhei para cima. Este momento, foi um momento com nada de especial que o demarcasse de tantos outros na minha vida. Mas é um momento que até hoje recordo nos momentos difíceis. Olhei para cima e estive quase a desistir… a sentar-me e a não avançar mais um passo. Mas houve um pensamento que me fez continuar... Pensei:
- Daqui a um bocado, estas em casa descansadinho a ver televisão. E vais-te sentir bem como se não tivesse sido nada.
O desfecho é previsível… desisti e pernoitei no local….
Ok estou a brincar! Continuei que nem um maluco e cheguei a casa todo podre mas feliz da vida. Vinguei-me em três bolicaos e dois iogurtes e não pensei mais no assunto até à noite.
De noite quando me deitei na minha caminha senti-me tão, mas tão bem, tão relaxado e feliz, e dei por mim a pensar naquele momento em que me tinha sentido tão mal durante a subida. E espantei-me com a nova perspectiva com que abordei o referido momento. A vida afinal, depende sempre da perspectiva… do momento em que nos encontramos. A subida tão tortuosa que fora, era agora passado. E os meus lençóis de flanela eram o presente aconchegante. E senti-me feliz…
Ao contrário de qualquer outra recordação que passa, essa, por mais insignificante que tivesse sido, ficou. Pensei nela várias vezes ao longo dessa semana. Pensei outras tantas o resto do mês. E a verdade é que ainda hoje, de cada vez que se me depara uma dificuldade na vida penso naquele dia. Penso que podia ser pior! Podia estar ainda a dois terços da subida, e nunca ter chegado a casa. Mas não… estou melhor, sempre melhor. E se sofro sei que será temporário. Proibido é desistir. Sei que no cume estarão sempre os meus Bolicaos e os meus lençóis de flanela.
Hoje, novamente de uma outra perspectiva sei aquilo de que não me apercebi na altura: A vida é feita de muitas montanhas que precisam de ser escaladas. O sofrimento estará sempre presente, e nós dar-lhe-emos a importância que nos aprouver. Será sempre mais feliz quem souber valorizar os lençóis de flanela e os bolicaos. Quem atribui excessiva importância à subida, acaba por não viver. Eu escolho por subir e não desistir. E enquanto o faço e sofro, sei que ainda poderia estar naquele dia longínquo a dois terços da subida. Mas não estou. E sinto-me bem por já ter ultrapassado tantas coisas más. E continuo a sofrer sem desistir, pois sei que invariavelmente no topo estará uma só coisa: O Bom Sucesso!
4 comentários:
Obrigada por este texto... Adorei ler, tão simples mas tão sentido...
A pausa inspirou-te.
O Bom Sucesso é o pior local!
ass: moradora em alverca!
Anonimo:
lol Olha uma conterrânea :P De facto o BS é uma bosta, mas olha... o nome até é fixe! E o pão do Santo Onofre se vier quentinho ainda se aproveita...
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